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SMD trading: como pode um fenômeno desses levar o SVB à quebra em 72 horas?

É inegável reconhecer o tamanho da dor de cabeça que inventei pra mim mesmo depois que entrei no mercado de ações, dedicado essencialmente às ações tech listadas na Nasdaq, liderando o Newton Tech Fund, nosso fundo focado em Tech na Bolsa. Começamos o fundo no rescaldo da pandemia e, após um primeiro ano de alta com mais de 20% de rentabilidade (em dólar!), enfrentamos uma sangria desatada nos preços das ações de tecnologia, nocauteadas pelos incrementos nos juros americanos, necessários ao combate de uma inflação praticamente inédita no mundo desenvolvido, consequência de uma pós-pandemia embedada em conflitos geopolíticos.


Brincamos no comitê do Newton que não adianta apenas ter estômago nos dias de hoje, é preciso ter é muito intestino, dado a persistência da crise que nos atinge, mesmo diante de doses expressivas de juros na busca de remediar a economia global. Pois bem, as últimas semanas parecem sugerir que o remédio já está além da dose, mesmo sem surtir os efeitos esperados até o momento. Estamos diante de uma crise bancária global das mais perigosas, com múltiplos bancos regionais enforcados por suas próprias decisões, afogados pelo tsunami de saques e venda de suas ações. Gigantes intocáveis como SVB e CS já foram à lona e a inflação ainda não dá sinais reais de arrefecimento, enquanto os Bancos Centrais agem como salva-vidas desesperados diante de tal tsunami – estão jogando todas as boias para tentar salvar os primeiros que afundaram, buscando acalmar um mercado que desaprendeu a nadar.


Explico-me: a crise atual possui um ingrediente completamente inédito para o cardume de investidores na Bolsa. Não estamos apenas diante de conflitos geopolíticos e suas possíveis consequências, ou apenas diante de uma inflação pós pandêmica com crítica inércia comportamental – estamos diante da primeira grande crise econômica global que se sujeita inevitavelmente às peripécias do social-media-driven trading (SMD trading).


Pode parecer apenas mais uma buzzword, mas essas três letrinhas quebraram um Silicon Valley Bank com 40 anos de história e serviços cruciais ao desenvolvimento da inovação no mundo, após uma mensagem de texto de Peter Thiel questionando sobre a solidez do banco diante de um deck para captação de recursos visando sanar seu balanço. Foram apenas 72 horas para que uma comunicação malfeita na captação de U$2bilhões se transformasse numa faísca para quebra, sem qualquer direito a respiro, do 16º maior banco americano. O SMD trading impulsionado pelos grupos de Messenger e WhatsApp de Venture Capitalists ao redor do mundo foi devastador. Não deu tempo sequer do banco preparar um comunicado decente ao mercado e já entrava em ação a intervenção do governo para tomada de seus ativos. A viralização da informação nas mídias sociais agravou em velocidade inédita o impacto no valor de mercado de demais bancos regionais, sendo a grande responsável pela flexibilização de uso do FDIC para quaisquer valores acima de U$250mil.


O SMD trading, antes tido como um fenômeno lúdico em ações como GameStop e memecoins, transforma-se cada vez mais num novo fator crítico na tomada de decisões de alocação, em especial na gestão de risco em carteiras cujos investimentos tenham stakeholders com alto nível de correlação e/ou codependência. Negócios que dependam de carteiras de clientes e/ou fornecedores com alto nível de comunicação entre si ganham novos vieses de risco – afinal, tais empresas acabam sendo mais suscetíveis à fenômenos de viralização. Negócios em cadeias produtivas nas quais líderes e referências de mercado tenham esse tipo de perfil também estão naturalmente expostos e é claro, a arte da comunicação na RI passa a ser ainda mais fundamental como elemento chave para mitigar comportamentos desenfreados no mercado.


A quebra do SVB é um lamento para todos nós que já trabalhamos e/ou investimos em startups – mas é uma lição sobre como estratégia de comunicação na RI é fator chave para sobrevivência de uma companhia num mercado exposto ao SMD trading. Para nós na Catarina Capital, aprendemos com o fato e definimos mais um ângulo crítico de análise em nossa gestão de risco. Para o mercado, haja estômago, intestino e tudo mais para poder atravessar o imbróglio atual – nossa visão é de que não há FDIC suficiente, nos EUA ou no mundo, para salvar a tudo e a todos. O tsunami está passando, vai levar muita gente e, como sempre enfatizamos, no longo prazo apenas os bons fundamentos prevalecerão.


Boa crise para todos nós! E aos longo-prazistas, muita atenção para a janela de baixa.


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